Dia 08 de abril de 2011, Natal, RN, o movimento #combustívelmaisbaratoja, iniciado nas redes sociais e microblog, inicia o primeiro dos protestos, dos muitos que ainda virão, contra o aumento abusivo do preço da gasolina, visando atacar o cartel que existe em nossa querida e tão castigada cidade.
Em off eu admito que errei o dia(rsrs), fui no dia anterior ao protesto no posto São Luiz na Av. Prudente de Morais, onde foi realizado, mas acabei fazendo um pré-protesto. O dia sete e oito foram bem legais, a receptividade dos motoristas em pleno engarrafamento foi surpreendentemente boa.
Algumas considerações:
Acredito que seja um momento inédito, para um povo que tradicionalmente é acomodado; sim, claro, isso de certa forma se justifica para a cidade mais sedentária do país, segundo a ONG Corações Brasil (*). Os natalenses parecem que, em sua maioria, são omissos perante os ataques que sofrem, podemos ver isso bem, por exemplo, no que toca o aumento estrondoso das passagens de ônibus, uma das passagens mais caras do Brasil e mais injustas pela qualidade do serviço, que ainda é privado, e não público. A população, não é raro, é tangida feito o gado, mediante as políticas de governo, nunca realmente comprometidas com o povo.
É verdade que nesta década que passou, a quantidade de veículos em Natal, aumentou absurdamente, 66,37%(**). Calculo que um terço da população utiliza como forma de transporte regular o carro, quer dizer, o uso do automóvel individualmente.
Bastante certo isso, pois os cidadãos não esperam, muitas vezes, nem o término da garantia para trocar de veículo, o que teoricamente, poderíamos tratar como um bem durável (esse termo ainda existe?), agora tudo me parece mais descartável nessa cidade – sim, é essa a dinâmica do modo de produção capitalista –, também estes mesmos cidadãos contribuem: compram por impulso, endividam-se até o pescoço; só basta estrear um novo modelo de carro, em dois ou três dias já começamos ver dezenas deles por aí.
Tudo é em nome dos sonhos de consumo que assolam a mente de nossos semelhantes desde cedo, na construção de uma sociedade desigual, onde o individualismo, o orgulho, o egoísmo imperam.
Tento de alguma forma traduzir esta minha análise para que possa ser mais bem compreendido o que penso. Os condutores de veículos automotores sabem, quão grande é o custo para manter uma tonelada de metal andando, e geralmente para levar uma pessoa de 70kg em média. Além de pagarem muitos impostos – o que eu mais ouço falar é IPVA.
Agora, abrindo uma conversa, quem estiver lendo este texto eu peço que me diga: em um ano quanto é gasto com o seu automóvel (caso tenha), incluindo também até o custo com combustível somado durante esses 365 dias, dentro da cidade.
Não sei dizer o resultado, mas pergunto: vale a pena? Depois pergunte a si mesmo, o que com esse valor você poderia fazer, sendo em seu próprio benefício, ou de outrem.
Os motoristas, na sua maior expressão, que utilizam o carro individualmente sentiram atacados no seu direito individual de locomover-se, claro, de carro.
“Boicote”, porque continuam abastecendo, seja ali no posto mais barato, ou obrigado, por via das circunstâncias a abastecer o tanque com R$ 2, 99, R$3, 00 o litro. Os condutores se encontram frequentemente reféns.
Os motoristas natalenses podem pagar, com aumento ainda assim, não correm o risco de mendigarem, tendo em vista as condições de sobrevivência, como alimentação, que atinge diretamente a população pobre; falo de pessoas em situação de pobreza extremada, em situação de risco, quando ficam doentes não tem nem condições de locomoverem-se ao serviço público de saúde, porque é muito longe ou porque é muito caro; alguns desses “pobres miseráveis” tiram dos lixões comida para satisfazer a fome de um dia inteiro. Nômades, se se fixam em algum lugar, formando aqueles aglomerados de barracos chamados de favelas...Pará...Pará...Pará!!! “Estou fechando o vidro nesse exato momento, aqui é perigoso’(acelera e passa rapidamente).
Apesar de ser muito bem disfarçada em Natal, a pobreza, a condição precária de vida em que vivem muitas pessoas continua presente, pode-se expulsar, pode-se fechar o vidro como fuga, destaco bem, como fuga da realidade. Até que chegamos aquele lugar, que quase nos sentimentos em casa, o posto de combustível, e depararmo-nos com a “injustiça” do preço da gasolina. Tocou na ferida, que nem é a ferida social da comunidade humana.
O que fazer? Já estão fazendo.
Vejo a oportunidade de revelar a vocês a cultura do automóvel – o belo é cada vez mais a artificialização da vida, a impermeabilização dos solos para construção e alargamento de vias para os automotores; a agressão à fauna, à flora, à pessoa humana, ao ar mais puro das América latina. Oh, o que era o nosso orgulho, é a nossa vergonha.
O dono de carro cobra medidas do Poder Público, mas não cobra de si a responsabilidade, a cidadania, não falo com relação ao ambiente, mas a vida humana.
O carro de fato segrega, impõe-se como o mais forte, o indestrutível na selva de pedra – vejo alguns motoristas que se sentem o próprio Robocop em seus veículos – Para onde isso vai? Diariamente morrem no Brasil 160 pessoas vítimas qualificadas por mortes violentas. Causa? Automóvel. As maiores vítimas: ciclistas folgados? Pedestres imprevidentes? Não, motoristas, jovens.
Campanhas de fiscalização, de educação parecem não resolver, os números aumentam. Será que não existem alternativas de transporte, NÃO ESTOU FALANDO DA BICICLETA, melhores? Será que o problema não está na estrutura fundamental de transportes que o Brasil escolheu que, as sociedades desenvolvidas experimentaram tempo atrás e hoje estão correndo atrás do prejuízo?!
A questão da gasolina vai além, denuncia toda essa cultura do insustentável, da violência e da morte. Quantas guerras hoje são travadas pelo petróleo? E parece, para mim, que existe uma guerra urbana. Nós ciclistas queremos Paz, boicotamos a gasolina sim, quebramos esse ciclo vicioso e oferecemos aos motoristas essa alternativa - desarme voluntário – chamando a luta por um transporte coletivo público de qualidade, barato, integrado ao uso das bicicletas; a luta por uma cidade feita para pessoas, não para carros. Essa é minha imagem do futuro, que não verei, e meus filhos também não verão.
Quer uma gasolina mais barata para andar mais de carro, engarrafar mais a cidade? É esse o pensamento, tão limitado, que de certa maneira observei, por parte de algumas pessoas no dia do protesto?
A Bicicletada estava lá para trazer essa crítica, educar e refletir sobre questões, apresentadas em nosso quotidiano, aparentemente sem ligação alguma, porém basta um estudo mais aprofundado, o exercício concreto da cidadania, exercício de uma imaginação sociológica, que faça integrarmo-nos ao que é melhor para o coletivo, o melhor para uma cidade pensada para pessoas.
Os motoristas de carros particulares têm tudo para conseguir o que reivindicam, vão conseguir possivelmente, porque a eles é dada mais importância que o resto da população que agoniza pela própria indiferença com que são tratados os direitos universais, em favor das necessidades de uma minoria abastada.
Pergunto-me: quando o petróleo acabar? O Mundo será mais feliz! Menos motor, mais amor! Um dos dizeres que levamos lá. Pese na balança.
“Se eu pudesse deixar algum presente à você, deixaria aceso o sentimento de amar a vida dos seres humanos. A consciência de aprender tudo o que foi ensinado pelo tempo a fora. Lembraria os erros que foram cometidos para que não mais se repetissem. A capacidade de escolher novos rumos. Deixaria para você, se pudesse, o respeito aquilo que é indispensável. Além do pão, o trabalho. Além do trabalho, a ação. E, quando tudo mais faltasse, um segredo: o de buscar no interior de si mesmo a resposta e a força para encontrar a saída.” Mahatma Gandhi.
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